Artigos de saúde
Neste Artigo:
- A
Epidemiologia do Sarcoma de Kaposi Pulmonar Relacionado à AIDS
- Patologia e História Natural da
Doença
- Diagnóstico: Sintomas e Exames Complementares
- Tratamento: Quimioterapia x Radioterapia x Anti-Retrovirais
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Antes do surgimento da AIDS e do sucesso dos transplantes de órgãos, o sarcoma de
Kaposi (KS) era um tumor raro que ocorria em 0,02 a 0,06 pacientes em 1000. No entanto, com
o início da epidemia da AIDS, nos meados de julho de 1981, começou a surgir um grande
número de homossexuais com lesões avermelhadas na pele, sempre associadas com outras
doenças oportunistas, como a candidíase oral e a infecção por pneumocistis carini.
Desde então, cerca de 15% a 20% dos pacientes infectados pelo HIV foram diagnosticados com
sarcoma de Kaposi. Tipicamente, essas lesões afetam a pele e os linfonodos, sendo que o
acometimento de outros órgãos é muito raro, mas apesar disso, o acometimento pulmonar
tem sido encontrado em um terço dos pacientes com AIDS com sintomas respiratórios. O
envolvimento pulmonar é muito grave e, sem tratamento, a média de vida após o
diagnóstico é de poucos meses. Com o tratamento e, principalmente, através da terapia
com anti-retrovirais, esses pacientes podem ter uma diminuição dos sintomas, com uma
melhora da qualidade e tempo de vida.
A Epidemiologia
do Sarcoma de Kaposi Relacionado à AIDS
Os primeiros casos de (SK) foram descritos por Moritz Kaposi em 1872, e era uma
condição associada a homens idosos do oeste da Europa. Também era comum na África
equatorial, sendo que em Uganda no ano de 1971 o SK era encontrado em 3% a 9% dos
pacientes com câncer, sendo a maioria dos pacientes do sexo masculino. O SK iatrogênico
(provocado pela ação dos médicos) atingia cerca de 7% dos pacientes transplantados que
estavam em terapia de imunossupressão, a fim de se evitar a rejeição dos órgãos e
nesse grupo os homens também eram os mais atingidos. Recentemente, os pacientes com AIDS
têm 100.000 vezes mais chances de desenvolver o sarcoma de Kaposi do que a população em
geral. Este risco está mais relacionado a homens que adquiriram o HIV em relações
sexuais com pessoas do mesmo sexo. Na verdade o SK é 20 vezes mais comum em homens
homossexuais com AIDS, do que em homens heterossexuais hemofílicos com AIDS. A relação
entre sexo masculino e feminino é de 20:1.
Segundo o Dr. David M. Aboulafia – hematologista e oncologista, nos Estados Unidos,
cerca de 40% dos homossexuais que receberam diagnóstico de AIDS nos anos 80 eram
portadores do Sarcoma de Kaposi; 10 anos depois o número de pacientes que receberam o
diagnóstico de AIDS e que apresentavam SK caiu para 10% a 20%. Esse fato pode ser
explicado devido ao diagnóstico precoce da doença, e pelo início do seu tratamento,
antes do desenvolvimento das doenças oportunistas, e também pela diminuição da
exposição aos fatores de risco para o SK.
Desde 1990 a incidência do sarcoma de Kaposi vem caindo rapidamente, principalmente
depois da introdução dos anti-retrovirais (combinação de duas, três, quatro ou mais
drogas). Em 1990 a incidência de SK em indivíduos infectados pelo HIV era de 60/1.000, e
em 1997 foi de 20/1.000. As análises preliminares dos anos de 1998 e 1999 mostram que
essa taxa continua diminuindo.
De acordo com Dr. David, antes da introdução dos anti-retrovirais o número de casos de
sarcoma de kaposi pulmonar não era bem conhecido, porque as alterações radiográficas
eram sempre atribuídas às infecções pulmonares. Nas biopsias feitas em pacientes com
SK cutâneo, após a morte, a incidência de SK pulmonar era de 47% a 75%. Em estudos
feitos com a broncoscopia, a incidência de SK pulmonar em pacientes com HIV e SK cutâneo
era de 6% a 32%, já nos pacientes com sintomas respiratórios e sem sinais cutâneos essa
taxa era de 8% a 14%, e subia para 21% a 49% naqueles pacientes com ambas as condições.
Mas a incidência de KS pulmonar isolado não é comum e varia de 0 a 15,3% nos pacientes
com AIDS.
Patologia e História Natural da
Doença
O Sarcoma de Kaposi é um tumor, de vasos sangüíneos, caracterizado pela presença de
uma neoformação vascular, com proliferação das células endoteliais, dos fibroblastos,
dos leucócitos (glóbulos brancos) e das próprias células tumorais fusiformes. Na pele,
o tumor pode se caracterizar como uma mancha avermelhada ou como nódulos
vermelho-purpuráceos ou azul-acastanhados. As lesões podem ser firmes e passíveis de
compressão, únicas ou numerosas. No pulmão, as lesões são submucosas planas,
vermelhas ou púrpuras, cujo aspecto é semelhante a hemorragias produzidas pelas lesões
do próprio broncoscópio. Elas podem ser encontradas em qualquer local, desde as cordas
vocais até as vias aéreas mais periféricas, e tendem a preferir as bifurcações das
vias aéreas. Outro sinal que pode ocorrer é o derrame pleural, que apresenta um aspecto
cristalino, mas é uma ocorrência rara, e geralmente está relacionada a alguma
infecção oportunista.
Conforme o Dr. David, grandes avanços vêm ocorrendo no conhecimento dos fatores que
contribuem para o desenvolvimento e evolução da doença. Estudos têm mostrado que as
células tumorais fusiformes encontradas no SK são anormalmente responsivas a uma enorme
quantidade de fatores de crescimentos endógenos (substâncias que estimulam o crescimento
celular do corpo humano). Estas substâncias são produzidas pelas células inflamatórias
que formam o tumor (os leucócitos).
A infecção por HIV faz com que o corpo produza grande quantidade desses fatores de
crescimento e, dessa maneira, favorece a multiplicação e a agressividade do tumor. Além
do mais, recentemente, foi descoberto que um vírus do tipo herpes está envolvido com a
presença do Sarcoma de Kaposi, e a infecção por HIV parece favorecer a infecção por
este vírus, que por outro lado possui uma ação cancerígena.
O futuro dos pacientes com sarcoma de kaposi é incerto, mas alguns estudos sugerem que os
pacientes com SK têm uma sobrevivência menor do que os pacientes somente com AIDS. Uma
classificação vem sendo proposta, para estratificar os pacientes de acordo com a
sobrevida, baseada na extensão dos tumores, da resposta imunológica do paciente (níveis
de linfócitos no sangue) e presença de outros sinais de comprometimento pela AIDS. Assim
sendo, aqueles pacientes que apresentam o SK restrito a pele e linfonodos, e apresentam
uma contagem de linfócitos CD4 maior que 150/muL e sem sinais de outra infecção
oportunista, apresentam melhor sobrevida.
Diagnóstico: Sintomas e Exames Complementares
Os pacientes com sarcoma de Kaposi apresentam sintomas que podem ser indistinguíveis
de uma pneumonia. Os principais sintomas são dispnéia (falta de ar) e tosse. Febre e
transpiração noturnas podem ocorrer. A tosse acompanhada de secreção, com sangue, é
rara. Outros sintomas que podem se encontrados são os roncos e estridores oriundos da
traquéia e da laringe. Mas muitos autores acreditam que os roncos, o sangramento, e a dor
torácica são devidos a infecções pulmonares oportunistas.
O SK pode provocar algumas alterações ao RX que são: infiltrado reticulonodular
formando a imagem do tumor (mancha esbranquiçada circunscrita na radiografia), infiltrado
intersticial difuso (o pulmão fica todo esbranquiçado), derrame pleural bilateral e
acometimento dos linfonodos hilares (áreas esbranquiçadas entre os dois pulmões).
Outros exames radiológicos que prometem ter um papel importante no diagnóstico são a
tomografia computadorizada e a ressonância magnética. Embora as imagens nesses exames
sejam sugestivas de sarcoma de kaposi, muitas vezes podem ser confundidas com infecções
oportunistas.
O diagnóstico de certeza pode ser feito através da broncoscopia, que mostra lesões
típicas (lesões nodulares submucosas com coloração vermelha a púrpura). Mas as
lesões podem ocorrer na periferia do pulmão não sendo alcançáveis pelo broncoscópio,
podendo também raramente, não estarem acompanhadas das lesões da pele. Nesses casos, a
punção com biopsia do parênquima pulmonar é útil. Entretanto, os médicos, não são
obrigados a realizá-la, por ser muito invasiva e trazer grandes riscos ao paciente com
AIDS, como infecções e hemorragias. Outro motivo que justifica o pouco uso da biopsia é
a sua baixa eficácia, em torno de 26% a 60%.
Tratamento: Quimioterapia x Radioterapia x Anti-Retrovirais
Os agentes usados na quimioterapia em pacientes portadores de Sarcoma de Kaposi
avançado incluem os alcalóides, as antraciclinas, a bleomicina e o etoposida. Segundo o
Dr. David, esses medicamentos só são efetivos quando usados em combinação. Porém,
alguns estudos com o uso associado dessas substâncias revelaram um acréscimo de apenas 5
a 6 meses de vida do que os pacientes não tratados. O esquema que obteve melhores
resultados foi a associação de adriamicina, bleomicina, vincristina ou vindesina (ABV),
com o qual houve uma taxa de resposta em torno de 30 a 50%, após 2 meses do início do
tratamento, mas a média de sobrevida é de 12 meses. Apesar dos avanços na
quimioterapia, sua principal limitação é aumentar pouco o tempo de vida dos pacientes,
e não promover a cura.
A radioterapia vem sendo aplicada há muito tempo nos pacientes com SK e tem alcançado
bons resultados. Mas a radioterapia torácica não tem sido bem tolerada pelos pacientes
com AIDS. Felizmente o tumor pulmonar é bastante responsivo à radiação, o que faz com
que as doses de radiação possam ser modestas. Contudo, o tratamento dos tumores
orotraqueais requer um certo cuidado, visto que as chances de mucosite (inflamação da
mucosa oral e traqueal), de candidíase e de reativação de focos de herpes oral são
muito grandes e essas doenças em pacientes aidéticos podem adquirir grandes
proporções. Contudo, os pacientes podem receber terapia profilática para cândida e
herpes antes de se iniciar o tratamento.
Com o avanço da tecnologia dos anti-retrovirais, os pacientes têm aumentado muito o seu
tempo de sobrevida e, concomitantemente, vem diminuindo os casos de infecções
oportunistas e outras doenças associadas a AIDS como o Sarcoma de Kaposi. E, por isso,
após a implantação dessas drogas, as taxas de incidência do Sarcoma de Kaposi estão
diminuindo dramaticamente. Mas essas drogas não curam a doença, e assim o Dr David
acredita que novos estudos devem ser realizados para se analisar outras combinações de
anti-retrovirais e de substâncias que curem o Sarcoma de Kaposi.
Fonte: Chest Volume 117, Number 4, Abril de 2000.
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