Artigos de saúde
Neste Artigo:
- O Que é um Placebo
- O Efeito Placebo
- A Teoria de Cura Mente-Corpo
- Dois Casos Verídicos
- Quando um Placebo é Benéfico
- Quando um Placebo Causa Danos
- A Expectativa de Cura
First, do no harm (Antes de mais nada, não cause danos).
Princípio da medicina, atribuído a Hipócrates
"A questão do placebo é um dos assuntos que mais fascinam e, ao mesmo tempo,
mais causam controvérsias entre a classe científica. Com todo o conhecimento que a
ciência hoje possui, o placebo ainda permanece um mistério e todo artigo sobre ele ainda
é bastante incompleto. Seu bom ou mau uso pode significar uma vida, principalmente
enquanto seus efeitos são pouco conhecidos a fundo e seu funcionamento, isto é, como
realmente agem os placebos, ainda é alvo de muitas teorias, inclusive a abordagem
psicológica. Para a classe científica, conhecer o placebo, suas possibilidades e seus
efeitos é fundamental. E para um leigo, até que ponto é interessante saber que um
remédio ao qual ele atribui sua cura não passava, por exemplo, de simples composição
de amido com açúcar? Estas e outras questões são apresentadas aqui para reflexão,
além da palavra de médicos que falam sobre o efeito placebo".
O Que é um Placebo
A palavra placebo vem do latim e foi cunhada da Bíblia cristã, após vários erros
de tradução, diz o doutor Ben Z. Krentzman. A palavra apareceu em primeiro lugar no
salmo 116 e foi adquirindo uma conotação científica nos dicionários ao longo do tempo.
Hoje, o placebo é em primeiro lugar definido como uma substância inerte ou inativa, a
que se atribui certas propriedades (como as de cura de uma doença) e que, ingerida, pode
produzir um efeito que suas propriedades não possuem. Muitas pessoas que ingerem, por
exemplo, uma pílula contendo nada mais que amido com açúcar, ou um dos dois
componentes, revelam melhoras de uma doença, imaginando ter tomado o remédio feito
especialmente para essa doença.
Mas o placebo não existe apenas em forma de uma substância. Uma ‘cirurgia
espiritual’, até que não se prove que ela genuinamente tenha acontecido, pode ser
um placebo. A pessoa ‘operada’ sente o corte, sente a sutura e fica
‘curada’ do mal que a afligia sem passar por uma cirurgia convencional.
Uma terapia também faz às vezes de um placebo, onde às técnicas dessa terapia se
atribui um tipo de cura e isso realmente acontece. As chamadas terapias alternativas, como
os florais, os cristais, a radiestesia e muitas vezes a própria psicoterapia ainda são
consideradas por uma grande parte da ala científica como um placebo, afirma Dr. Walter
Brown, psiquiatra.
Mas o uso do placebo não está restrito à área científica ou à área das terapias
alternativas. Nossas avós conheciam muito bem os seus efeitos, quando aplicavam suas
‘poções mágicas’, e até mesmo suas histórias na hora de dormir, e curavam
as dores de seus filhos, um ensinamento popular que é passado de geração a geração,
sem questionamentos.
Também nessa categoria se encontram as orações, que promovem os chamados milagres e a
conhecida ‘cura pela fé’, pelo menos enquanto para esses milagres e curas não
se encontre uma comprovação, agem como um placebo.
E por fim, os próprios remédios, mesmo sendo fabricados com uma fórmula teoricamente
capaz de combater determinada doença, podem, por erro de fórmula não curar determinada
doença, mas tomados para esse fim, podem ainda assim agir como um placebo.
Alguns efeitos do placebo estão discutidos na seção a seguir.
O Efeito Placebo
O efeito placebo é o resultado que se pode observar e mensurar, em uma pessoa ou em um
grupo de pessoas, diante de um tratamento onde o placebo foi administrado, de acordo com
Dr. Robert T. Carroll, que acrescenta: "Por que uma ‘fake’ (falsa,
artificial) substância, cirurgia ou terapia faz efeito, isso ainda não é completamente
explicado".
Alguns pesquisadores utilizam o procedimento chamado ‘duplo-cego’, em que
normalmente existem dois grupos de pessoas, o grupo experimental e o grupo de controle. A
um grupo, administra-se a droga ou o tratamento convencional. A outro grupo, aplica-se a
droga ou o tratamento do tipo placebo. Dr. Carroll explica que, em um estudo duplo-cego, o
pesquisador não sabe qual grupo recebeu a droga indicada para o tratamento e qual grupo
recebeu o placebo. Ele só vai saber, diz o médico, quando tiver em mãos os resultados
completos, para evitar que o avaliador incorra em distorções de observação e de
mensuração durante o estudo.
A Teoria de Cura Mente-Corpo
A teoria de cura mente-corpo, criada por Milton Erickson, pai da hipnoterapia moderna,
e divulgada pelo mundo pelos médicos que foram seus discípulos, reconhece a existência
de uma estreita conexão entre a mente, o cérebro e o corpo. Dr. Ernest Lawrence Rossi,
médico e psicoterapeuta ericksoniano, diz que a resposta placebo é uma pedra fundamental
rejeitada na cura mente-corpo. Ele diz que as histórias de cura espontânea ou
considerada ‘milagrosa’ são menosprezadas pela ciência, devido à nossa mente
racional, como resultados não confiáveis. Em seu livro A Psicobiologia de Cura
Mente-Corpo, Dr. Rossi diz que a premissa da ciência, neste caso, se aproxima de algo
como "não é confiável, portanto não é real". Ele explica que, para uma
parte da ciência, que tem uma abordagem tradicional, o efeito placebo é simplesmente um
"fator aborrecido".
A teoria de cura mente-corpo pressupõe que exista uma rede de informações que passa do
ambiente à mente do indivíduo, deste para o cérebro e em seguida ao corpo, através do
que ele chama de "moléculas mensageiras". Em princípio, diz ele, a
informação começa com os genes.
As pesquisas de Dr. Rossi incluem o funcionamento do sistema nervoso central de forma
detalhada e também o funcionamento do sistema límbico-hipotalâmico. Na teoria
ericksoniana, existe uma lista considerável de doenças que se pode curar conhecendo-se o
mecanismo de comunicação psicofísico. Com lugar de destaque para o placebo nesta
abordagem e também para os fatores que determinam o stress, Dr. Rossi cita alguns casos
verídicos e curiosos, que correm os bastidores da comunidade científica e provocam
polêmica até hoje. Dois deles estão a seguir.
Dois Casos Verídicos
Estes e outros casos, registrados por Dr. Rossi, mostram que a resposta placebo pode
se manifestar em doença ou cura.
O primeiro caso é relatado por Dr. Rossi como um caso de "vida e morte vodu",
ou como "o complexo de desistência no sistema nervoso autônomo", onde um
médico da Fundação Rockfeller, a serviço em uma missão no Pacifico Ocidental,
convivia com nativos convertidos e não convertidos. O caso envolveu o padre da missão,
seu assistente de serviços gerais, um nativo chamado Rob e um feiticeiro de nome Nebo.
Certo dia, o padre veio até o médico depois de constatar que o nativo Rob estava muito
doente. O médico examinou o nativo e não encontrou sinais de febre, nem queixas de
dores, nem sinais evidentes de doença, mas, ao mesmo tempo, ficou impressionado ao
constatar que o nativo estava extremamente fraco e doente. Por meio do missionário, o
médico soube que o feiticeiro Nebo havia apontado um osso para Rob e o nativo se
convenceu que iria morrer. O médico e o missionário foram até Nebo e o intimaram a ver
Rob, caso contrário seu suprimento de comida, fornecido pela missão, seria cortado. O
feiticeiro foi com eles até o nativo e, lá chegando, aproximou-se de Rob dizendo que
tudo havia sido uma brincadeira, um engano. O médico (cujo relatório na íntegra foi
publicado no livro de Dr. Rossi e nos artigos do fisiologista Walter Cannon) ficou
estupefato ante a metamorfose. De uma fase de pré-coma o nativo passou imediatamente a
uma fase saudável, com total força física, e na mesma tarde estava perambulando pela
missão.
Dr. Rossi relata, mostrando artigos de outros pesquisadores como Cannon e Engel, que a
morte vodu, muito comum naquela região, é devida a uma exposição intensa e prolongada
ao stress emocional e à crença dos nativos de que estavam sob o poder do médico
feiticeiro. A causa ‘real’, na verdade, era um sistema nervoso simpático
superativado. Em outro caso semelhante, um nativo veio a falecer diante de um agudo
completo "desiste-retoma" e de um poderoso agente sugestionador, que acabou se
revertendo em tempo no caso do nativo Rob.
O segundo caso, descrito ainda por Dr. Rossi em seu livro, é do Sr. Wright, o qual estava
acometido de mal generalizado e avançado envolvendo os nodos linfáticos, linfossarcoma.
O Sr. Wright desenvolveu uma resistência a todos os tratamentos paliativos conhecidos e
sua anemia o impedia de esforços com raios-X ou tratamento quimioterápico. Massas
tumorais do tamanho de uma laranja já existiam no pescoço, axilas, virilha, peito e
abdômen. O baço e o fígado estavam enormes e o duto torácico obstruído. A impressão,
diz Dr. Philip West que acompanhou pessoalmente o caso, é de que ele estava em estado
terminal e não-tratável.
Contrariando isso tudo, o Sr. Wright se encontrava menos desesperançado que seus médicos
e pediu para ser incluído em um grupo de pesquisa que iria testar uma nova droga, o
Krebiozen (que depois se demonstrou ser uma preparação inócua e sem utilidade). Os
médicos não o consideraram qualificado para o experimento, já que não contavam que seu
câncer pudesse regredir, depois de tudo já ter sido tentado. Sua expectativa de vida era
de duas semanas, não mais que isto. Mas o Sr. Wright havia lido nos jornais que a
clínica estava pesquisando o Krebiozen e implorou para ser colocado entre os que iriam
receber a droga.
Ele mostrou enorme entusiasmo ao chegar a droga e implorou tanto que, contra todas as
regras, seu médico acabou concordando em incluí-lo.
Dr. West, então, permitiu que ele recebesse injeções da droga, sendo que a primeira foi
numa sexta feira, quando o médico, segundo conta Dr. Rossi em seu livro, foi para casa
imaginando que na segunda feira, com quase toda certeza, infelizmente encontraria o
paciente já sem vida. Mas, para surpresa de Dr. West, o Sr. Wright estava à sua espera.
Sem febre, nada abatido, andando normalmente. Nenhuma mudança para pior foi observada. As
massas de tumor haviam desaparecido, mostrando uma regressão mais rápida que o médico
pudesse até mesmo entender.
O Sr. Wright teve alta e foi para casa, quando saiu novamente nos jornais que o Krebiozen
era inócuo. O homem teve uma recaída e retornou ao hospital. Desta vez, porém, foi o
médico quem propôs que ele retomasse as injeções de Krebiozen, alegando que a droga
surtia efeito e que o que saíra no jornal era referente a um lote da droga com validade
ultrapassada. Dr. West fez isso porque sabia que seu paciente saíra do estado terminal
para voltar para casa são, graças à esperança que ele depositava na nova droga, e
sabia também que nada mais poderia ajudá-lo. Novamente, a doença do Sr. Wright
regrediu, diante das injeções. A recuperação, segundo o médico, foi ainda mais
intrigante, pois as massas tumorais se dissolveram, o fluido no peito se extinguiu e ele
voltou a andar. O caso do Sr. Wright teve um final menos auspicioso que o do nativo Rob,
pois ele acabou falecendo, semanas depois de ter novamente sido veiculado no jornal –
que ele tomou conhecimento – de que o Krebiozen realmente não tinha função alguma.
No entanto, o caso se tornou clássico para o eterno dilema da resposta placebo até mesmo
em doenças graves como o câncer. O que todos os médicos do Sr. Wright concordaram foi
que seu poder de otimismo, de alguma forma, havia influído nas várias fases de
"desiste-retoma", em que o paciente atribuiu ao placebo uma qualidade salvadora,
daí seu tempo de vida ter sido pelo menos prolongado e com evidentes manifestações de
cura.
Quando um Placebo é Benéfico
Um placebo pode ser especialmente benéfico quando algumas situações abaixo
acontecem:
1. O médico, por observação clínica, tem de início um pré-diagnóstico da
possível doença do paciente mas não deseja administrar uma droga química, devido aos
efeitos colaterais indesejáveis, e então aplica um ‘remédio’ que na verdade
não tem a função de curar aquela doença. O paciente toma e, acreditando estar tomando
um remédio poderoso, fica livre da doença ou pelo menos dos sintomas.
2. O paciente deseja sinceramente se ver livre de alguma doença ou problema físico e
não só deposita esperança no remédio que está tomando, mas também permite que o
remédio faça efeito.
3. O indivíduo, mesmo sabendo que está tomando um placebo, ainda assim deseja se livrar
do desconforto físico e o próprio indivíduo, atribuem qualidades de cura ao
‘remédio’ e permite também que esse faça o efeito.
4. A simples ida ao médico, que compreende a presença do médico diante do paciente, o
ritual da anamnese (coleta de dados) e da observação clínica, o toque da mão do
médico na pessoa, a atenção, a roupa branca do médico, esse aparato, por si só, é
passível de provocar o efeito placebo, quando o paciente manifesta melhoras, porque
confia em seu médico, segundo Dr. Brown.
5. Um placebo pode ser benéfico nos casos em que, ingerido em lugar de uma droga
química, não provoca os efeitos colaterais que a droga provocaria. Existem pacientes que
são sensíveis ou alérgicos a certos medicamentos, e o placebo, como uma substância
inerte, não provoca efeitos colaterais.
6. Principalmente, um placebo é benéfico quando promove a cura, a melhora ou o alívio
da doença.
7. Segundo Dr. Brown e Dr. Rossi, existem casos comprovados de melhora nas questões do
stress e em pessoas com úlceras gástricas, verrugas, artrites e outras deficiências
relacionadas ao sistema imunológico.
Quando um Placebo Causa Danos
Existem riscos para o uso indiscriminado dos placebos, alerta Dr. Brown quando diz que
seu uso acaba evocando também a questão da ética. Ele questiona que, por um lado, o
médico não deve enganar o indivíduo, e, por outro lado, não pode furtar-se em aliviar
suas dores. Aqui, alguns exemplos dos efeitos não benéficos do placebo:
1. Quando o paciente toma um placebo e sente melhora dos sintomas, mas na realidade a
doença continua avançando e pode ser fatal.
2. Quando, diante de uma droga química comprovadamente eficaz para determinada, o médico
opta por um placebo.
3. Alguns pacientes, relata o Dr. Brown, apresentam efeitos colaterais mesmo com um
placebo. Ele não cita, porém, que efeitos seriam estes.
4. Na automedicação, quando um placebo é recomendado por um amigo ou comprado por conta
própria na farmácia.
5. Quando a pessoa despende seu tempo, sua vida e suas economias com um tratamento tipo
placebo que não é a melhor indicação para o seu caso.
6. Na visão de Dr. Brown, o placebo não funciona para doenças mais sérias como o
câncer, para a qual seria mais indicado o tratamento tradicional.
A Expectativa de Cura
Dr. Ernest Rossi afirma que a expectativa positiva de cura por parte de um paciente é
50% do caminho para sua recuperação. Nesses casos, o organismo, entre outras coisas,
libera endorfina, que promove o relaxamento do estado de ansiedade provocado pelo pânico
de uma doença.
A expectativa de cura é hoje muito mais reconhecida pelos médicos como um dos fatores
benéficos decisivos, muito mais que 30 anos atrás quando se deu o caso do Sr. Wright.
Se ela realmente tem um papel fundamental no desempenho dos sistemas simpático,
parassimpático e nos outros sistemas do organismo, a expectativa de cura pode ser
considerada como uma espécie de ‘certificado de garantia’ para o funcionamento
do corpo, no entendimento do médico. De acordo com a teoria ericksoniana, o locus de
cura está dentro do organismo do próprio indivíduo, bastando ver que algumas doenças,
mesmo sem remédio, também se curam espontaneamente. Essa abordagem, ainda pouco
conhecida na América Latina, utiliza vários recursos antes de desistir e entregar o
paciente à própria sorte. E, em meio a esses recursos, a resposta placebo é uma delas.
Copyright © 2004 Bibliomed, Inc. 23 de Agosto de 2004
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