Artigos de saúde
Neste Artigo:
- Região da Serra Foi Alvo de Pesquisa
- Estudo Revelou Consumo
Superior a Um Litro por Semana
- Hábitos dos Pais têm Influência
Direta
- Alcoolismo Precoce Dá Sinais Específicos
- Aumenta o Consumo Entre Adolescentes
Brasileiros
- Biotônico Fontoura na Mira do Governo
"Um estudo inédito desenvolvido por profissionais do Hospital de Clínicas de
Porto Alegre revelou que os hábitos, a cultura e o ambiente são fatores que
potencialmente influenciam o uso de álcool na infância. A pesquisa teve como base a
cidade gaúcha Flores da Cunha, na região da Serra, considerada o maior pólo produtor de
uva e vinho do País".
Região da Serra Foi Alvo de
Pesquisa
O alcoolismo na infância é um problema social que deve ser discutido por todos. Muito
embora se saiba que a grande maioria dos casos ocorra por influência de amigos e colegas
de escola, é preciso prestar atenção para a influência do ambiente familiar. Pesquisas
já comprovaram que o uso abusivo do álcool pelos familiares é capaz de levar uma
criança a despertar inocentemente o interesse pela bebida.
No entanto, uma pesquisa inédita no Brasil, realizada por profissionais do Hospital de
Clínicas de Porto Alegre (HCPA) no Rio Grande do Sul, estudou a influência dos hábitos
regionais na incidência do uso de álcool entre crianças. A coordenadora do estudo, a
gastroenterologista do HCPA, Themis Reverbel da Silveira, teve o interesse despertado pelo
assunto quando, ao tratar vítimas de cirrose hepática por álcool, notou que três eram
oriundas de uma região tradicionalmente produtora e consumidora de vinho no Rio Grande do
Sul: a Serra Gaúcha.
Estudo Revelou
Consumo Superior a Um Litro por Semana
O trabalho, intitulado "Consumo de Bebidas Alcoólicas por menores de 15 anos
residentes em um município de colonização típica italiana no Rio Grande do Sul",
foi realizado no ano de 1991 junto a 92 famílias residentes na zona rural do município
de Flores da Cunha. Após analisar os hábitos familiares e acompanhar de perto uma
criança de cada família, a pesquisa revelou que 58,5% das crianças ingeriam algum tipo
de bebida alcoólica. A alta incidência foi diagnosticada em crianças com idade entre
oito meses a nove anos. "As mães têm o hábito de molhar o bico da chupeta da
criança, ainda muito pequena, no vinho", afirmou Themis. Mas ela ressalta que nada
é feito de forma intencional. O que leva os pais a essa atitude são os hábitos
culturais daquela região, típica produtora de vinho.
O que preocupa a especialista é a quantidade de álcool consumida pelos menores. Em
alguns lares foi verificado que crianças chegavam a ingerir 1,3 litro de álcool por
semana, sem que o alto consumo fosse notado pelos pais. "Um volume muito alto que
chama a atenção", afirma. Outro resultado interessante da pesquisa é que 75% das
crianças que faziam uso regular do álcool, no caso vinho e cerveja, eram do sexo
masculino e apenas 25% do sexo feminino. Para a gastroenterologista do HCPA, esse dado
revela a imposição machista que predomina naquela região. "Os pais consideram
normal que o filho homem beba, até pela sua condição de macho", disse Themis.
Hábitos dos Pais têm
Influência Direta
Entre os 58,5% das crianças que ingeriam regularmente o álcool no ambiente
familiar, 100% dos pais e 75% das mães tinham o hábito de beber diariamente. "Além
disso, 51% dos entrevistados tinham produção própria de vinho e 2% produziam em casa a
graspa, bebida obtida pela destilação da uva fermentada", informa Themis. Para ela,
todo o trabalho serviu para mostrar a facilidade do acesso da criança ao álcool no
ambiente familiar. "O 'terreno' naquela região é altamente propício para que
menores de 15 anos, no futuro, venham a constituir grupo de risco", salientou.
Estudos realizados com crianças em períodos distintos indicou a redução da idade
média de início do uso do álcool. Um trabalho elaborado no ano de 1993 junto a escolas
de dez capitais brasileiras mostrou que a idade média era de 13 anos. Já em outra
pesquisa feita no ano de 1997, com crianças que já estavam em tratamento, a idade média
passou para 11 anos.
Para a médica clínica especialista em dependência química do Hospital Nossa Senhora da
Conceição, de Porto Alegre, Elaine Segura, só há um jeito de uma criança desenvolver
a dependência pelo álcool: usando. Neste sentido, o comportamento familiar tem
importância fundamental. "O consumo de álcool pelos pais ou parentes próximos
despertam o interesse das crianças. Pode acontecer a aversão pelo álcool nesses casos,
mas não é freqüente", salientou Elaine. A experiência de oitos anos no tratamento
de dependentes junto ao Setor de Alcoolismo e Dependência de Outras Drogas do Hospital
Conceição leva a especialista a acreditar que, em alguns casos, as crianças passam a
consumir o álcool com o propósito inocente de proteger os pais.
Também há relatos de crianças que passam a adquirir o hábito influenciadas pelas
mães, Elaine explica. "Como o vício não é socialmente aceito entre as mulheres,
muitas vezes as mães pedem para seus filhos comprarem o produto no bar. Isso gera um
hábito na criança", afirmou. Vale lembrar que a legislação brasileira proíbe a
venda de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos. Na teoria, pois na prática a
situação é bem diferente no Brasil.
"Em hipótese alguma deve se oferecer álcool a uma criança, mesmo quando imperem
fatores como tradição e cultura", destacou a médica do Conceição. Os efeitos do
álcool no organismo de uma criança têm um impacto muito maior em relação aos adultos
pois, antes dos 14 anos, o fígado ainda não está pronto para metabolizar o álcool.
Alcoolismo Precoce Dá Sinais
Específicos
O alcoolismo precoce compromete o desenvolvimento, a coordenação motora e o
funcionamento do fígado. O uso excessivo de bebidas pode afetar praticamente todos os
órgãos e sistemas do organismo. O aparelho gastrintestinal é particularmente atingido.
Podem ocorrer gastrites, úlceras, inflamação do esôfago, pancreatite e cirrose. Outros
aparelhos atingidos são o cardiocirculatório (podendo ocorrer pressão alta, infarto do
miocárdio) e o sistema nervoso (epilepsia, lesões em nervos periféricos).
O alcoolismo infantil dá sim, sinais claros. A combinação de três dos sintomas a
seguir indica uso de álcool pelo jovem: mudanças bruscas de humor, isolamento, tonturas,
inapetência, andar cambaleante, vermelhidão, enjôos, tremores, sonolência,
agressividade e mau desempenho escolar. Ao diagnosticar o problema, os pais devem manter o
diálogo aberto, mostrando o certo e o errado. Outra dica é buscar ajuda especializada
para si mesmo.
Aumenta o Consumo Entre
Adolescentes Brasileiros
Mesmo proibida para menores, a ingestão de álcool por adolescentes tem crescido nos
últimos anos. Pesquisa feita em 1995, com 600 adolescentes do Rio de Janeiro e de São
Paulo, revelou que 42% bebiam eventualmente, índice bem superior ao dos que usam maconha
(4%) ou cocaína (1%). Outro estudo, realizado em 1996 pelo Centro Brasileiro de
Informações sobre Drogas Psicotrópicas da Universidade Federal de São Paulo em dez
estados brasileiros, mostrou que 19% dos jovens entre 10 e 18 anos tomavam bebida
alcoólica mais de seis vezes por mês. Em 1989, esse índice era de 14%. Os que consumiam
álcool cerca de 20 vezes por mês passaram de 8% para 12%.
Estudos apontam que 10% da população brasileira, aproximadamente 16 milhões de pessoas,
são alcoólatras e que apenas 20% deles se recuperam. Outros estudos apontam que havendo
motivação e apoio familiar, a eficácia dos tratamentos fica em torno de 50%. A
internação, ainda vista como a melhor alternativa pelos familiares, é indicada em menos
de 10% dos casos.
Biotônico Fontoura na Mira do
Governo
Comprar para as crianças fortificantes que estimulam o apetite antes das
refeições pode tornar-se um ato ilegal. Um projeto de lei que proíbe a venda em São
Paulo de produtos como Biotônico Fontoura foi aprovado pela Assembléia Legislativa.
Segundo a deputada estadual Edir Sales (PL), autora da idéia, os fortificantes fazem com
que os menores se tornem alcoólatras, caso tenham predisposição à doença.
"O Biotônico Fontoura, por exemplo, tem o mesmo teor alcoólico do vinho branco.
Poucas mães sabem disso e dão a seu filho esses produtos sem saber que podem estar
criando um alcoólatra", afirmou. Alguns médicos, no entanto, afirmam que a proposta
não tem nenhum embasamento científico.
O Conselho Regional de Farmácia do Distrito Federal (CRF-DF) também encaminhou denúncia
ao Congresso Nacional acusando o fabricante do remédio Biotônico Fontoura, a DM
Indústria Farmacêutica, sediada em São Paulo, de manter o teor alcoólico da
medicação acima do tolerável. O biotônico tem 9,5% de etanol em sua composição,
concentração maior à de uma lata de cerveja, que apresenta 5% de álcool, em média.
Segundo o CRF-DF, o excesso de álcool no produto pode levar crianças à dependência.
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09
de março de 2001
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