Artigos de saúde
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Neste artigo:
- Introdução
- Patogênese
- Manifestações clínicas
- Diagnóstico
- Tratamento
- Medidas de Controle
- Referências
Introdução
O grupo das febres maculosas compreende várias zoonoses causadas por 
microorganismos do grupo das riquétsias. No Brasil, a espécie mais importante é 
a Rickettsia ricketsii, que causa a chamada febre maculosa brasileira 
(FMB). Nos EUA, ela causa a febre maculosa das montanhas rochosas (FMMR). Em 
muitos lugares do mundo, as riquétsias são consideradas microorganismos 
emergentes ou re-emergentes, e as doenças causadas por elas apresentam amplo 
espectro de gravidade. A mais grave de todas é a FMMR, com letalidade de 
aproximadamente 23% caso o diagnóstico e tratamento não sejam precoces. 
Em nosso país, o microorganismo é transmitido principalmente pela picada do 
carrapato Amblyomma cajenense (carrapato-estrela), e a maioria dos casos 
da doença ocorrem nas épocas do ano em que há um aumento no número desses 
vetores. A probabilidade de transmissão aumenta com o tempo de contato do 
carrapato com a pele do indivíduo. O cão doméstico é considerado um reservatório 
potencial e, em algumas epidemias, os eqüinos também estão envolvidos. A doença 
não é transmitida de pessoa a pessoa.
A FMB tem sido considerada endêmica em algumas regiões dos estados de São Paulo, 
Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Embora o carrapato seja bastante 
comum nas regiões rurais desses estados, os casos relatados são provenientes de 
apenas alguns locais, sugerindo que diferenças ecológicas regulam a ocorrência 
da R. rickettsi entre os carrapatos e, consequentemente, a ocorrência da 
doença. Uma das hipóteses é de que a presença de espécies menos patogênicas de
Rickettsia é capaz de suprimir a disseminação da R. rickettsi. 
Outros fatores como a umidade, variações climáticas, atividades humanas 
modificadoras da flora e da fauna e uso de inseticidas podem desempenhar um 
papel na flutuação da população dos vetores. Importante ressaltar que, nos 
vetores, o microorganismo pode ser transmitido verticalmente, mantendo o agente 
infeccioso na natureza.
Patogênese
Os microorganismos são inoculados na derme do hospedeiro, juntamente com 
secreção salivar do carrapato, após aproximadamente 6 horas de contato com a 
pele. A picada é indolor e, geralmente, passa despercebida. A disseminação das 
riquétsias ocorre por via linfo-hematogênica, após o que elas aderem às células 
endoteliais e induzem sua endocitose. No citoplasma, elas escapam à ação do 
fagossomo e multiplicam-se por divisão binária, transmitindo-se às outras 
células adjacentes. A conseqüência é a formação de múltiplos focos de células 
endoteliais infectadas, correspondendo às lesões (ou seja, ao rash 
maculopapular). Não existem evidências que apóiem a ação de endotoxinas ou 
exotoxinas, e os estudos in vitro sugerem que a lesão celular é causada 
por radicais livres, pela ação da fosfolipase das bactérias e por outras 
proteases. A R. rickettsi é a mais invasiva das riquétsias, podendo 
infectar também as células musculares da parede dos vasos.
Ao contrário do que se pensa, trombose oclusiva e necrose isquêmica não são os 
principais responsáveis pela lesão tecidual e orgânica, na FMB. O principal 
efeito patofisiológico da lesão endotelial é o aumento da permeabilidade 
vascular, resultando em edema, hipovolemia, hipotensão e hipoalbuminemia. A 
hipovolemia leva ao aumento da secreção de ADH, causando uma hiponatremia. A 
lesão dos capilares pulmonares causa um edema pulmonar não-cardiogênico. Em 
resposta às lesões desenvolve-se um estado pró-coagulante, com consumo focal de 
plaquetas levando a trombocitopenia em 32% a 52% dos casos. No entanto, a 
coagulação intravascular disseminada ocorre raramente.
Manifestações clínicas
Após um período de incubação médio de 7 dias, o paciente inicia um quadro 
inespecífico composto por febre alta (frequentemente acima de 38,5ºC), mialgia, 
cefaléia, mal-estar, náusea, vômitos e anorexia. Com o passar do tempo, o quadro 
geral deteriora, porém como os sintomas iniciais são semelhantes aos de outras 
infecções, muitas das quais virais, o diagnóstico precoce é bastante difícil.
O rash é o principal sinal para o diagnóstico, mas aparece em apenas 14% dos 
pacientes no primeiro dia da doença, e em 49% durante os primeiros 3 dias. 
Geralmente, o rash surge após 3 a 5 dias do início da febre, estando nessa 
ocasião presente em até 91% dos casos. O rash é formado por máculas de 1mm a 5mm 
que aparecem inicialmente nos punhos e tornozelos; o envolvimento das palmas das 
mãos e das solas dos pés é considerado típico da doença, porém sua ocorrência é 
bastante variável (32% a 82% dos pacientes com rash). Com o agravamento da lesão 
endotelial, ocorre hemorragia no centro das máculas, formando uma petéquia que 
não desaparece à digitopressão. Importante lembrar que em 9% a 16% dos casos o 
rash não aparece e alguns desses pacientes apresentam graves lesões viscerais.
Acometimento cardíaco revela-se principalmente pelo desenvolvimento de 
disritmias, o que ocorre em 7% a 16% dos casos. O envolvimento pulmonar ocorre 
em até 17% dos casos, sendo uma das principais causas de óbito na FMB. Da mesma 
forma, o acometimento do sistema nervoso central é determinante do prognóstico 
da doença. Déficits neurológicos focais, surdez transitória, meningismo e 
fotofobia podem sugerir meningoencefalite ou meningite. O exame do líquor mostra 
pleocitose com predomínio de polimorfonucleares ou mononucleares, 
hiperproteinorraquia em um terço dos casos e hipoglicorraquia em apenas 8% dos 
casos. Vários outros sintomas relacionados ao acometimento do SNC já foram 
relatados, como afasia, disartria, paralisia de nervos cranianos, nistagmo, etc.
O acometimento renal, com insuficiência renal aguda pré-renal, decorre da 
hipovolemia e resolve-se com a reposição volêmica. Porém, em alguns casos ocorre 
necrose tubular aguda, levando à necessidade de diálise. Lesão hepática, em 38% 
dos casos, manifesta-se com aumento de transaminases; a icterícia ocorre em 9% 
dos casos, mas a hiperbilirrubinemia é mais comum. A lesão endotelial grave pode 
levar à hemorragia, um evento potencialmente fatal. Embora a anemia ocorra em 
30% dos casos, só requer transfusão em 11% deles.
Na história natural da doença, a morte ocorre em aproximadamente 8 a 15 dias do 
início do quadro. Existe uma apresentação fulminante, a qual é rara, na qual a 
morte ocorre após 5 dias. Essa apresentação foi relatada em homens negros 
portadores de deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase. Mesmo com o 
tratamento adequado os pacientes podem desenvolver seqüelas, especialmente 
neurológicas.
Diagnóstico
O diagnóstico precoce é difícil de ser estabelecido e, antes do surgimento do 
rash, é baseado em dados clínicos e epidemiológicos. O dado epidemiológico mais 
importante é a história de exposição a ambiente infestado por carrapatos, nos 
dias anteriores. A lista abaixo apresenta os principais diagnósticos diferenciais da 
FMB.
1- Diagnóstico diferencial da Febre Maculosa Brasileira
- Febre Tifóide
- Sarampo
- Rubéola
- Infecção de Vias 
		Aéreas Superiores
- Gastroenterite
- Meningoencefalite 
		por outros agentes
- Meningococcemia
- Sífilis Secundária
- Leptospirose
- Vasculite por 
		Imunocomplexos
- Púrpura 
		Trombocitopênica Idiopática
- Mononucleose 
		Infecciosa
- Erliquioses
- Reações Secundárias 
a Medicamentos
A minoria dos pacientes apresenta a tríade clássica de febre, rash e exposição a 
carrapatos. Quando o rash aparece, o diagnóstico de FMB deve ser considerado, 
embora várias outras doenças apresentem manifestação semelhante. 
Os exames laboratoriais são relativamente inespecíficos. A contagem global de 
leucócitos geralmente é normal, mas observa-se aumento de formas jovens. Anemia 
ocorre em até 30% dos casos e trombocitopenia é mais freqüente nos casos mais 
graves. Alterações do coagulograma são incomuns. A hiponatremia é observada em 
metade dos casos e há também elevação de LDH e CK, sugerindo lesão tecidual 
difusa. 
Os métodos imunológicos são os mais utilizados para a confirmação diagnóstica. 
Porém, esses métodos são retrospectivos, pois os anticorpos só começam a ser 
detectados na fase de convalescença. Além disso, não permitem a definição da 
espécie envolvida. Na fase aguda da doença, na presença de rash, pode-se 
realizar biópsia de pele e técnicas de imuno-histoquímica para o diagnóstico 
precoce, porém esses testes não estão disponíveis em todos os serviços. Outra 
técnica que pode ser usada precocemente é o isolamento das riquétsias, em 
amostras de sangue inoculadas em porcos da índia, ovos embrionados ou cultura de 
células. A reação de Weil-Felix não é um método confiável devido à baixa 
sensibilidade e especificidade. 
A imunofluorescência indireta é o método mais aplicado no diagnóstico, sendo o 
de maior sensibilidade e especificidade. O título diagnóstico considerado é 
1:64. As técnicas de PCR não mostraram boa sensibilidade para o diagnóstico 
precoce da doença.
Tratamento
Inicialmente, a estabilização do quadro e o tratamento de suporte são 
essenciais. Incluem a administração de fluidos, transfusão sanguínea quando 
necessária e abordagem dos sintomas. A letalidade da doença caiu 
significativamente após a introdução do uso das tetraciclinas e do 
cloranfenicol. Além desses antibióticos, a R. rickettsi é sensível à 
rifampicina, algumas quinolonas (como a ciprofloxacina) e à claritromicina; 
porém a experiência com esses agentes ainda é insuficiente para indicar seu uso. 
A riquétsia é resistente aos beta-lactâmicos, aos aminoglicosídeos, ao 
sulfametoxazol-trimetoprin e à eritromicina. 
Segundo recomendações da FUNASA, o tratamento em adultos é feito com 
cloranfenicol na dose de 500mg de 4/4 horas no primeiro dia, seguido de 500mg de 
6/6 horas a partir do segundo dia, sendo mantido por no mínimo 19 dias ou até 3 
dias após o término da febre. Em crianças com idade inferior a 8 anos, 
recomenda-se a dose de 50 a 100mg/Kg/dia, em quatro tomadas diárias, com dose 
máxima diária de 2g, sendo a duração do tratamento a mesma dos adultos. Acima 
dos 8 anos de idade, pode-se usar a doxiciclina na dose de 2 a 4mg/Kg/dia, em 2 
tomadas, não ultrapassando 200mg/dia. Em pacientes grávidas, utiliza-se o 
cloranfenicol. O tratamento endovenoso é indicado nos casos graves e quando o 
paciente apresenta náuseas e vômitos. Embora o uso de tetraciclinas em crianças 
com menos de 8 anos não seja recomendado, aceita-se o uso da doxiciclina em 
crianças de todas as idades, devido ao caráter ameaçador da doença, mas a FUNASA 
não menciona essa recomendação.
Em alguns casos mais graves, os corticóides são utilizados, mas não existem 
dados que apóiem o seu uso. Assim, não são recomendados. 
Medidas de controle
Em primeiro lugar, lembrar que a FMB é doença de notificação compulsória em 
nosso país. Uma das ações principais é a orientação dos profissionais da saúde, 
quanto aos sinais e sintomas da doença, bem como a abordagem diagnóstica e 
terapêutica. Todo caso suspeito deve ser submetido a coleta de amostra de sangue 
para exame confirmatório. As recomendações da FUNASA incluem a coleta, com luvas 
e pinça, dos carrapatos eventualmente presentes na pele do paciente, devendo os 
mesmos ser encaminhados ao laboratório de referência. As outras atividades de 
vigilância epidemiológica são essenciais.
Rodízio de pastos e a capina da vegetação podem ter algum efeito no controle da 
população dos carrapatos, mas o uso de carrapaticidas é desapontador. A 
população deve ser orientada a evitar transitar em áreas onde a presença do 
vetor é provável, bem como a cobrir bem o corpo com roupas claras, que facilitem 
a identificação do vetor.
Embora tenham sido identificados os principais antígenos de superfície das 
riquétsias (OmpA e OmpB), ainda não dispomos de uma vacina contra a doença. Os 
estudos em animais são bastante animadores. Assim, nos dias de hoje a principal 
arma no controle da doença é evitar o contato com o vetor.
Referências
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